O mundo da moda sustentável pode ser avassalador, devido aos novos materiais, terminologias e novos conceitos a surgirem todos os dias.
O consumo excessivo na indústria da moda é um grande problema, afinal todos temos mais peças de roupa do que aquilo que realmente precisamos e as marcas continuam a produzir e a produzir, muito mais do que o nosso planeta consegue suportar. Estima-se que o número de vezes que usamos uma peça diminui para cerca de 36% nas últimas duas décadas, no entanto continuam a terminar, frequentemente, em aterros sanitários.
Não está de todo errado comprar nos saldos, mas sim comprar sem precisar. Por essa razão defendo que nunca foi tão importante termos o dever de comprar menos, melhor e mais duradouro.
Mas como é que podemos fazer isso? Como é que sabemos que estamos no caminho correto?
Quando decidi mudar o meu estilo de vida para um estilo mais consciente, uma das primeiras grandes mudanças foi em relação ao meu guarda roupa. Obviamente não iria descartar o que tinha só por ser fast fashion, mas quando senti necessidade de comprar uma peça nova tinha como objetivo recorrer a marcas que me identificasse e que ao mesmo tempo estivessem alinhadas com os meus valores.
Para mim enquanto consumidora gosto de me sentir informada, pois só assim é possível evitar o greenwashing e garantir uma boa escolha. Só assim podemos optar por marcas que estão a tomar medidas em prol do nosso planeta e a ter em consideração as pessoas que fazem as nossas roupas.
Índice
Fast Fashion vs Slow Fashion
Sabias que a indústria da moda é a segunda mais poluente do mundo?
A indústria têxtil é responsável por 20% das águas residuais e 10% das emissões de gases de efeito de estufa a nível mundial, de acordo com os dados mais recentes da Organização Mundial das Nações Unidas..
A indústria da moda cresce a uma velocidade exponencial e os hábitos de consumo desenfreados de roupa estão a contribuir para uma degradação acelerada do planeta. Incentivados pelos preços baixos e pelas novas coleções a cada duas semanas, a nossa forma de consumir é excessiva, isto porque compramos mais do que precisamos e usamos cada vez menos vezes antes de descartarmos.
O que é Fast Fashion
As mais conhecidas e acessíveis lojas como Zara, Mango, Primark, H&M, Topshop ou outras no Brasil como Renner, Riachuelo e Pernambucanas, investem em peças que acompanham as tendências da alta costura, porém a um custo baixo para o consumidor e, consequentemente, um tempo de vida reduzido. Esta fórmula tornou-se rapidamente num fenómeno mundial pelos motivos óbvios.
O conceito fast fashion traz várias ameaças devido às suas premissas ecologicamente erradas, tais como:
- Fica apenas atrás da indústria da produção de petróleo no ranking das indústrias mais poluentes;
- Aumenta a quantidade de recursos naturais e matérias-primas que são extraídos do nosso planeta;
- Incentiva e alimenta o trabalho precário, afinal já grandes marcas foram apanhadas em contratações ilegais, poucas condições de trabalho, pagamentos ínfimos e horários de trabalho extensos.
Isso ocorre porque as marcas querem entregar com rapidez e acompanhar as tendências, garantindo sempre preços baixos.
O significado de slow fashion
Apesar de ainda haver um longo caminho a percorrer para mudar mentalidades, felizmente, há cada vez mais consciencialização para este problema. A prova disso mesmo é que o conceito slow fashion (em oposição ao conceito fast fashion), tem vindo a destacar-se no mercado, dando-nos a possibilidade de consumir de forma consciente e benéfica para o meio ambiente.
Slow fashion é um conceito que tem vindo a ganhar bastante destaque no mercado, pois dá a possibilidade de consumir de forma consciente e benéfica para o meio ambiente. Cada vez há mais marcas a adotar métodos de gestão e produção sustentáveis, que nos fazem acreditar que o futuro pode ser melhor para todos. Este conceito surge como uma alternativa mais sustentável no mundo da moda e tem um papel fundamental para a consciencialização, já que gera alertas para as consequências negativas da produção em massa.
“Sustentável” e “ético” são palavras cada vez mais usadas e começam a ficar conhecidas, utilizadas para fazerem referência à forma como a cadeia de valor é repensada e como as pessoas são tratadas ao longo de todo o processo, desde as que cultivam as matérias-primas até às que costuram ou vendem uma peça. Uma marca que se considera ética destaca os direitos dos trabalhadores, tais como horários máximos de trabalho, saúde e segurança, liberdade de associação e salários justos, tudo aspetos que são (ou devem!) ser tidos em conta e respeitados.
Outros aspetos dos quais a slow fashion se destaca são:
- considera a preservação do meio ambiente em todas as etapas de produção das peças, de modo a reduzir os químicos poluentes e a quantidade de matérias-primas que é retirada da natureza;
- peças produzidas localmente, para redução da pegada carbónica;
- peças pensadas para serem mais duráveis e de uso prolongado.
Conceitos importantes da sustentabilidade na moda
As nossas escolhas definem-nos mas também impactam o que está ao nosso redor. Portanto, se optamos por comprar determinada peça a determinada marca estamos a contribuir para aquele mercado, seja ele um mercado com impacto positivo ou negativo. A Joana Campos Silva dá um bom exemplo disso no seu artigo “A Zara como solução”, onde refere uma (boa) prática incomum dos países nórdicos da Europa, em que não compram peças de roupa se a sua origem for da Turquia, pois é um país que priva as mulheres da sua liberdade e, como tal, não querem compactuar com este mercado.
Na minha opinião podemos e devemos manifestar-nos sobre a forma como consumimos. De forma a ajudar a fazer as escolhas certas, deixo aqui alguns termos que considero importantes cada um de nós saber:
- Compensação de Carbono: No mundo da moda é necessário reduzir as emissões dos gases efeito de estufa (GEE) e, por essa razão muitas marcas estão a repensar as suas cadeias de valor e a investir em projetos que não emitem CO2, como forma de compensar as emissões que produzem, por exemplo, investindo na reflorestação.
- Greenwashing: Define-se pela utilização de marketing verde de forma enganosa, com o intuito de promover uma percepção errada de que as políticas ou produtos das empresas são mais sustentáveis do que aquilo que efetivamente são. Por isso, é tão importante ir mais longe do que aquilo que nos é dito nos rótulos das embalagens, porque termos como “natural”, “orgânico”, etc. são abrangentes, o que significa que a regulamentação, nestes casos, nem sempre é específica ou pode ser facilmente contornada.
- Upcycling: As marcas que estão a ficar mais conscientes valorizam cada vez mais as matérias primas dos seus produtos. Por isso é que o upcycling é uma tendência crescente que consiste em transformar e reutilizar matéria prima que seria considerada desperdício. Um bom indício é o facto de marcas como Balenciaga e Miu Miu já estarem a aderir a esta tendência.
- Transparência: Um dos factores cada vez mais exigido às marcas, que sejam capazes de rastrear os seus produtos e comunicarem com transparência. Isto significa que as empresas devem ser capazes de divulgar informações sobre toda a cadeia de valor e informações ao nível de políticas de sustentabilidade.
- Materiais Biodegradáveis: Esta tipologia de materiais são os que se decompõem naturalmente através de microorganismos como bactérias e fungos. No entanto, são necessárias várias condições como a temperatura e os nutrientes que afetam a capacidade destes materiais se decomporem (já para não falar nos corantes e lavagens que afetam estes materiais).
- Microplásticos: Tal como o nome indica é plástico em pequenas partículas, podem nem sempre ser visíveis a olho nu, sendo que os materiais sintéticos são os principais responsáveis. Este é um problema crescente que contribui muito para a poluição do nosso mar. No entanto, há coisas simples que cada um de nós pode usar para diminuir esta poluição, começando pelos filtros de microplásticos para lavagem da roupa, como o saco Guppyfriend ou a bola Cora Ball.
Marcas de moda sustentáveis no Brasil
Ginger
A GINGER nasce da paixão de Marina Ruy Barbosa pela moda autoral, estética e o respeito pela natureza. Esta marca tem preocupações éticas e ambientais pois tem vindo a colaborar com a ONG Gerando Falcões contribuindo com uma percentagem das vendas para projetos que apoiam jovens e adolescentes que vivem em favelas do Rio de Janeiro.
Insider
Insider é uma marca inovadora que nasce da necessidade de um dos sócios e faz surgir a Undershirt Insider, criada com o objetivo de solucionar o problema de quem sofre de suor excessivo. A partir deste problema descobriram outros e desenvolveram tecnologia têxtil para reduzir o uso de recursos naturais e o impacto no meio ambiente.
Yes I Am Jeans
As peças da Yes I Am Jeans focam-se em peças básicas e confortáveis. Utilizam tecidos de qualidade e com cores neutras, diminuindo assim a necessidade de produtos químicos nos processos de lavagens.
Tudo é produzido de forma consciente e ética, com uma mão de obra qualificada e justa. A transparência com o consumidor destaca a marca de outras.
Flávia Aranha
Na Flávia Aranha o objetivo é criar peças com histórias e afetividade, como resultado criam peças intemporais e duradouras.
Todo o tingimento é natural, assim combinam o conhecimento ancestral com inovações tecnológicas para promover relações mais humanas e impactos positivos em todos os pontos da cadeia.
No meio de tudo isto são ainda uma empresa com certificação B (Bcorp).
Marcas que se destacam na moda consciente
O capitalismo trouxe-nos hábitos de consumo e produção que agora precisamos de contrariar e repensar, por isso se vê cada vez mais marcas que ou se estão a adaptar ou já nascem com um propósito consciente. Destaco aqui algumas marcas quer a nível internacional quer a nível nacional.
Marcas internacionais de moda sustentáveis
Pangaia
A Pangaia não é apenas uma das melhores marcas de moda sustentável, como também um movimento. Foi lançada em 2018 e procura resolver questões ambientais da indústria da moda através da tecnologia.
As últimas coleções da Pangaia utilizam materiais como couro de uva, fibras de algas marinhas, materiais reciclados, corantes vegetais, pétalas de flores, entre outros. A principal fonte de inspiração da marca é sem dúvida o meio ambiente. Por isso, em cada coleção traz elementos da natureza em diferentes aspectos. O lançamento mais recente foi a linha de calçado com couro de uva, que é zero desperdício.
Ganni
A Ganni é uma marca de moda dinamarquesa, que defende que não é uma marca sustentável, pois levam a sustentabilidade bastante a sério e são honestos nos pontos a melhorar. O que acaba por se refletir nos direitos dos trabalhadores, na cadeia de valor e na transparência quanto à origem dos materiais.
É uma marca que está ativamente a reduzir o uso de plásticos e está empenhada em reciclar roupas, acessórios e tecidos mortos para minimizar o desperdício. Lançou um programa de devolução e uma plataforma de aluguer para prolongar a vida útil das suas peças de vestuário.
Patagonia
A Patagonia conhecida pelas suas peças de aventura e outdoor, e tem como missão “construir o melhor produto, não causar danos desnecessários, usar os negócios para inspirar e implementar soluções para a crise ambiental”. Esta missão reflete a longa jornada na sustentabilidade da marca, que durante a COP26 anunciou que não se quer denominar de uma “marca sustentável”, reconhecendo que, apesar de seus esforços, ainda é parte do problema.
A marca usa principalmente materiais reciclados e tem um programa de devolução e reparo vitalício para todos os seus produtos. Apesar de ainda usar animais na sua cadeia de valor tenta fazê-lo com a maior responsabilidade possível. Para além disso, ainda pretende reduzir a sua pegada, reduzindo as emissões em toda a sua cadeia de suprimentos.
As marcas têm o poder de mover o consumidor, tal como moldaram o nosso comportamento para sermos extremamente consumistas agora têm um papel de repensar este consumo. A nossa ajuda, conhecimento e opções contribuem para que estas marcas se sintam pressionadas a repensar os seus modelos de negócio e o seu valor e se tornem em marcas que apostam na sustentabilidade como um fator competitivo.